Todos somos estranhos: até percebermos que isso é normal
A saúde mental não pode ser um tabu, não é uma moda, não é luxo, não é mania, é saúde, tal como a saúde física, e por isso a minha sugestão cultural é o livro “Todos somos estranhos: até percebermos que isso é normal” do António Raminhos. É um livro que conta como é viver com Perturbação obsessiva-compulsiva. Como o próprio nome indica é uma doença psiquiátrica que se caracteriza pela presença de obsessões e/ou compulsões. Essas obsessões e compulsões interferem nas atividades diárias e causam sofrimento na vida do doente.
No prefácio escrito por Claúdio Pina Fernandes, psicólogo clínico, começa por partilhar dados, segundo um estudo realizado pela Faculdade de Ciências Médicas da UNL de 2013, 4,4% dos portugueses cumprem os critérios para o diagnóstico de Perturbação Obsessiva-Compulsiva. Sendo este um número tão elevado, pode-se concluir que esta é uma doença muitas vezes vivida em silêncio. Segundo Claúdio Fernandes, esta muitas vezes é vivida em silêncio por “não falarmos de coisas estranhas que achamos que conseguimos controlar, porque aparecem muitas vezes como manias que não interferem muito com as rotinas diárias e, frequentemente, porque quem vive com Perturbação Obsessiva-Compulsiva está preso no aparente absurdo da sua própria condição.”
Este livro dá o contributo para quebrar o isolamento da doença. António Raminhos ao partilhar a sua jornada com grande honestidade sobre as suas obsessões, ansiedade e medos de uma forma bem-humorada, utilizando assim o seu talento como humorista para abordar um tema sério como uma doença psiquiátrica de uma maneira divertida e leve, consegue ainda criar uma conexão com o leitor, fazendo com que nos sintamos menos sozinhos em nossas próprias lutas internas. E ao tornar pública a sua história torna a doença em motivo de discussão pública. Para aqueles que sofrem da doença, esta história é uma via de identificação com uma vivência que conhecem e para quem não sofre da doença é a hipótese de acesso ao que é viver e lidar com um problema desta natureza.
Algo que refere no seu livro, é que ao longo da sua jornada descobriu que não está sozinho, muitas pessoas partilham dos mesmos sentimentos e que algo que tem vindo a aprender é que sinceridade consigo mesmo e com os outros é libertador. Refere ainda que “Não somos a ansiedade. Não somos o medo, as dúvidas, as noites sem dormir, o choro. Não somos a perturbação obsessiva, a depressão, a síndrome de pânico, qualquer outra fobia ou condição. Somos muito mais que um diagnóstico. Somos a soma de experiências, de atitudes, de vivências, de relacionamentos connosco, com os outros e com o mundo.”
E o que podemos retirar deste livro, é que ninguém é a sua condição, uma doença mental não é uma condenação, mas sim algo com o qual teremos que relacionar-nos, aceitando e cuidando de nós mesmos, tal como faríamos com outra doença.